Natal (27/05/2011) – Desde março último, agentes de fiscalização do Ibama/RN vêm cumprindo uma difícil rotina, que começa ao entardecer e só termina com os primeiros raios do sol. Eles vigiam as áreas de postura das arribaçãs (Zenaida auriculata noronha) entre os municípios de Jandaíra, Lajes e Caiçara do Norte. O trabalho consiste em percorrer estradas, penetrar na mata fechada, montar campanas, sempre com o objetivo de impedir a entrada de caçadores, que se aproveitam da escuridão para matar, indiscriminadamente, filhotes e adultos dessas aves.
A ação tem trazido excelentes resultados, pois as capturas diminuíram
sensivelmente nessas áreas tradicionalmente visitadas pelas arribaçãs.
“Quase não tivemos caçadores neste ano”, comemora o chefe do Escritório
Regional do Ibama em Mossoró, Linduarte Lopes, que é também o
coordenador das ações. Em anos anteriores, as apreensões de arribaçãs
mortas pelos fiscais atingiam números impressionantes, que superavam
milhares de unidades.

Toda a preocupação em torno da proteção das arribaçãs faz sentido.
Embora não esteja ameaçada de extinção, essa pequena pomba sofre intensa
pressão de caça, o que pode prejudicar seus estoques naturais. Ainda
persiste no RN um comportamento altamente reprovável, encontrado em
todas as classes sociais – o consumo de arribaçãs como petisco. No
passado, a captura da arribaçãs para alimentação fazia sentido. Mas hoje
nada justifica continuar realizando um abate cruel para satisfazer o
paladar de seus consumidores.
Cruel é a qualificação correta do método de caça da arribaçã. Segundo
Linduarte Lopes, os caçadores invadem os pombeiros à noite munidos de
uma espécie de lamparina e um porrete. Com a luz, as aves ficam
atordoadas e são abatidas facilmente a pauladas, sejam filhotes ou
adultos – não há seletividade. É corrente entre os fiscais a história de
um caçador que apanhava os filhotes com a mão e, para não perder tempo,
os matava arrancando a cabeça com seus próprios dentes.
Gestos bárbaros motivados pelo apetite dos cidadãos potiguares. Afinal, se não houver quem compre, não há estímulo para a caça.
Mas, apesar do esforço dos fiscais do Ibama e de seus colaboradores
(veja quadro ao lado), os caçadores ainda tentam invadir os santuários
de reprodução. De março até hoje, foram apreendidas cerca de 300
arribaçãs mortas. O prejuízo para os caçadores apanhados foi grande:
além de perderem três motos, duas bicicletas e até arreios de cavalos,
receberam multas que, somadas, ultrapassam os R$ 137 mil. Quatro deles
foram detidos em flagrante e responderão a processo por crime ambiental,
cujas penas podem chegar a uma ano e meio de detenção.
As atividades de proteção às arribaçãs vão perdurar por pelo menos
mais 30 dias, enquanto houver a formação de pombeiros. O Ibama recomenda
a todos os cidadãos potiguares para que não consumam arribaçãs ou
qualquer tipo de caça. A aquisição desses animais abatidos é ilegal e
sujeita os infratores a multas e penas de detenção de até um ano. O
comércio desses animais, vivos ou mortos, deve ser denunciado pelo
telefone 0800-61-8080 ou (84) 3211-0100 (em Natal).
De caçador a defensor das arribaçãs

Enoque quase não ri, mas percebe-se que está muito alegre com o seu
trabalho. Voluntário do Ibama há cerca de seis anos, revela que é a
primeira vez que vê resultado positivo como esse. Ele sabe que é peça
fundamental das ações. Exímio conhecedor da região e das artes da caça –
“fui caçador, também, pegava até 500 delas por noite, até que o Ibama
me pegou e multou” –, Enoque orienta os fiscais no campo e ainda
convence os moradores de seu assentamento a não pegar arribaçãs.

A temporada de Enoque junto ao Ibama se encerra quando os filhotes
acompanharem os adultos e os pombeiros se desfizerem. O ciclo é regulado
pelas chuvas, como ele sabe muito bem: “Chove pra ela chegar, chove pra
ela pôr [os ovos], chove pra ela tirar [nascer], chove pra ela voar”.
Mas, na sua comunidade, em Jandaíra, Enoque ainda terá muito trabalho.
Ele é um dos fundadores da “Associação de Educadores Ambientais dos
Assentamentos Guarapes e Boa Vista” e pretende ensinar tudo o que sabe
em defesa do meio ambiente. Sorte dos moradores dos assentamentos. E de
todos os riograndenses do norte. Enoque não tem anel no dedo, mas,
pensando bem, isso até poderia atrapalhar.
Airton De Grande - Ascom/Ibama/RN
fotos: Linduarte Lopes e Airton De Grande - Ibama/RN
fotos: Linduarte Lopes e Airton De Grande - Ibama/RN
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