São várias décadas de obras privilegiando a ocupação dos espaços vistos apenas como boas oportunidades de negócios.
A realização da Copa do Mundo e a qualidade do ar de São Paulo seriam
temas distintos, caso não tivessem um encontro traçado pelo destino. E,
neste momento, não me refiro à densa névoa que cobre os preparativos
para a Copa do Mundo, cercados de mistério e de negociações nebulosas
que deixam o ar irrespirável. Na verdade, ambos os assuntos deverão ser
discutidos por nativos e turistas daqui a três anos em 2014, afinal
nesta mesma época, os problemas que afetam as condições atmosféricas
deverão estar ainda piores do que as registradas nos últimos dias.
A
triste combinação entre frio, ar seco e poluição já é responsável por
um aumento de 62% nas internações na capital paulista, conforme
noticiado pelo Jornal da Tarde, no dia 18 de julho. Fatos não
raros que se repetem ano após ano, inclusive com registros de mortes
diretamente ligadas aos crescentes e inaceitáveis índices de poluição do
ar. E, infelizmente, a população não pode contar com ações realmente
sérias do poder público para ao menos reduzir as suas principais causas.
Tais
problemas, é claro, não surgiram recentemente. São várias décadas de
obras privilegiando a ocupação dos espaços vistos apenas como boas
oportunidades de negócios. Faltaram e continuam faltando planejamento e
bom senso. Resultado: mais poluição e menos qualidade de vida.
Se
hoje já contamos com mais de sete milhões de veículos circulando por
nossas entupidas ruas, a entrada de mais de mil novos carros emplacados
diariamente na cidade só faz imaginar que durante a Copa os problemas
serão multiplicados. Mesmo com automóveis menos poluentes, não é
possível imaginar que teremos em 2014 um ar mais puro para respirar.
O
ritmo frenético dos lançamentos imobiliários é outro fator que colabora
para piorar as condições climáticas, ao eliminar áreas verdes para a
subida indiscriminada de espigões. Uma troca nefasta de árvores que
absorvem gás carbônico deixando em seu lugar uma cidade mais
impermeabilizada e cinza. Uma equação bastante simples e óbvia que
agrava os casos de enchentes e aumenta a sensação de calor no verão. Já
nestes dias de inverno, entre outros problemas, contribui para
dificultar a dispersão de poluentes.
Tempo existe para mudar esse
estado de coisas e alterar o caminho de São Paulo rumo a um
desenvolvimento mais sustentável. Mas é preciso que, restando três anos
para a abertura da Copa do Mundo, nossas autoridades pensem e respirem
profundamente, com cuidado para não se intoxicarem, e comecem já a agir
em prol da cidade para as pessoas. Mais transporte coletivo e mais áreas
verdes serão muito bem-vindas. Afinal, com Copa ou sem Copa, os milhões
de habitantes de São Paulo vão permanecer por aqui, vivendo e
respirando, quem sabe, ares melhores num futuro próximo.
* Reinaldo Canto
é jornalista, consultor e palestrante. Foi diretor de Comunicação do
Greenpeace e coordenador de Comunicação do Instituto Akatu. É colunista
da revista Carta Capital e colaborador da Envolverde.
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